Em cada recomeço, uns prometendo estudar mais. Outros comerem menos gordura. Alguns não trabalharem tanto. A maioria querendo mesmo é ser feliz e sem saber como. Ou sabendo, mas não conseguindo.

Minha percepção é que, de modo geral, muita gente promete coisas que quase nunca cumprirão naqueles vagos planos de intenções de final e início de ano. Mas, faz parte da natureza humana esse tipo de promessa pois cria uma ilusão gostosa, gera um pouquinho de perdão e auto aceitação.

Nesse cenário marcha aquele sujeito que promete e, como um sacerdócio, cumpre ao pé da letra, o prometido. Por exemplo, quando decide emagrecer: a partir do dia “xis” (sempre há um dia para começar), tem início a luta e, de um momento para outro, o tipo deixa de comer gorduras, doces, frituras, refrigerantes; não vai mais a festas e, quando vai, fica no light, carta fora do baralho, chato absoluto. Resultado: desponta o processo de emagrecimento, mas, junto com ele, desaparece o viço, desbota-se o colorido, perde-se a graça. É justo que as pessoas cuidem da saúde. Nada contra isso. Mas não acredito em radicalismos: sejam eles no início, no meio ou no final de ano.

Outra coisa que acontece nesse período é a decisão por um curso especial, um esporte, um novo hobby. Excelentes atitudes. Só que muitas vezes sem a necessária vocação, sem o desejo verdadeiro e alardeadas aos quatro ventos. Mais como obrigação para justificar um descuido, uma ausência, um pecadinho que, na maioria das vezes, só existe na nossa cabeça. E segue-se o rito de iniciação: matrícula na escola, na academia, aquisição de tênis especial, agasalho fashion, bandanas, entre outros badulaques. E quase sempre os primeiros dias são maravilhosos: o ego nas alturas, novos amigos e dedicação integral. Em seguida a leve constatação do sacrifício, o início do arrependimento e a dúvida. Depois, uma ou outra falta, a desculpa esfarrapada e por fim “tchau”: a parafernália toda esquecida num armário.

Também conheço pessoas que se propõem a fazer uma determinada coisa e fazem questão de não “causar”. Optam por não serem chatas e atingem seus objetivos, discretamente, fazendo da atividade um novo hábito, íntimo encontro e dedicada paixão. E, por último, há aqueles que não vão mudar de forma alguma, não pensam em emagrecer, não querem praticar exercícios, adoram ficar até tarde no trabalho e por aí vai. E são felizes com seus corpos, com suas mentes e seus estilos de vida: não dão satisfações a ninguém e nem se incomodam com a opinião alheia.

E essa é a nossa realidade, o nosso charme: gordinhos, esportistas, nerds, magrelinhos, CDF’s, divertidos, workaholics, teimosos, perseverantes, chatos, preguiçosos, indecisos, dorminhocos. E por mais que queiramos mudar continuamos idênticos, com os mesmos ingredientes, os mesmos temperos, a mesma casca que o tempo se encarrega de aperfeiçoar ou arruinar. Pensamos exclusivamente em nós e no espelho e acabamos deixando de lado as pessoas que nos cercam, que nos amam de verdade e que nos querem assim: com nossos piores defeitos, com nossas vaidades inofensivas, com nossas manias esquisitas e nossas pequenas virtudes.

Exatamente como um dia nos conheceram. Exatamente como aprenderam a gostar de nós, a nos suportar e respeitar. Exatamente como éramos no ano passado. Do jeito que sempre fomos. Sem tirar nem pôr.

Agliberto Cerqueira
Publicitário pelo Instituto Metodista, aprendiz de farmácia na infância, executivo da indústria automobilística, diretor de agência de promoção e consultor na área de comunicação e marketing. Em 2006 publicou o livro de contos "O quá quá quá do cisne preto - Um passeio ao som do rádio". Quando não está em consultoria e nem pagando imposto, lê muito, escreve quando possível e toca violão.
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