Se você é uma dessas pessoas noturnas que luta todos os dias para se encaixar em uma sociedade que exige que você se levante cedo, não se sinta mal: pode ter uma mutação genética responsável por tal característica.

Em um estudo de 2017, pesquisadores descobriram que muitas das pessoas que ficam acordadas até tarde e têm dificuldade para levantar de manhã não são preguiçosas, mas seu relógio interno é simplesmente geneticamente programado para funcionar 2 a 2,5 horas mais lento que o resto da população, graças a uma mutação no gene CRY1.

“É como se essas pessoas tivessem um jet lag perpétuo”, disse um dos pesquisadores do estudo, Michael Young.

O problema de ser “noturno”

Para deixar as coisas claras, não estamos falando daqueles que ficam no celular até tarde e depois têm problemas para adormecer. Essas pessoas, se ficarem alguns dias acampando longe das luzes da cidade e sem dispositivos eletrônicos, geralmente se sincronizam com a luz natural rapidamente e passam a dormir e acordar de acordo com o nascer e o pôr do sol.

Os verdadeiros notívagos são pessoas que, mesmo na ausência de smartphones e luzes elétricas, ainda adormecerão e acordarão tarde.

Essas “corujas” não conseguem dormir o suficiente e são frequentemente diagnosticadas em clínicas de sono com “síndrome do atraso das fases do sono” (SAFS). Os pesquisadores estimam que cerca de 10% da população mundial seja afetada por essa condição.

Além de ficarem mais cansadas, as pessoas com SAFS sofrem com uma série de problemas de saúde porque seu corpo está constantemente tentando alcançar o cronograma estabelecido pelo resto da sociedade. A condição tem sido associada à ansiedade, depressão, doença cardiovascular e diabetes, sem mencionar a constante frustração de ser traumatizado pelo despertador a cada manhã.

A mutação

Geralmente, o relógio do corpo humano é de cerca de 24 horas, o que significa que coisas como digestão, sono e reparo celular se encaixam perfeitamente em um dia padrão da Terra.

Graças a uma mutação no gene CRY1, no entanto, algumas pessoas simplesmente precisam de mais tempo.

A mutação foi identificada pela primeira vez há quase uma década, quando uma mulher de 46 anos procurou uma clínica de sono por conta de seu ciclo de sono tardio. Mesmo depois de ter sido colocada em um apartamento sem janelas, TV ou internet por duas semanas, a mulher ainda tinha um ritmo circadiano estranhamente longo de 25 horas, bem como sono fragmentado.

Depois de estudar seus genes, os cientistas descobriram que ela tinha uma mutação de uma única letra no CRY1, que interfere no ciclo circadiano.

Nosso relógio circadiano começa cada dia construindo proteínas, chamadas ativadores, em nossas células. Esses ativadores produzem seus próprios inibidores que, com o tempo, impedem os ativadores de trabalhar. Quando todos os ativadores em uma célula são silenciados, os inibidores não são mais produzidos e gradualmente os ativadores voltam a subir, iniciando o ciclo para o próximo dia mais uma vez.

A proteína produzida pelo gene CRY1 é um desses inibidores. Mas os cientistas ainda não tinham certeza de como uma única variante do gene poderia ter efeitos tão extremos no relógio biológico dessa mulher.

O estudo

Para o estudo de 2017, os pesquisadores decidiram analisar a família da mulher, descobrindo que todos tinham a mesma mutação. Neles, a proteína inibidora CRY1 se torna excessivamente ativa e suprime o ativador por mais tempo do que deveria, prolongando o ciclo diário das células.

Em seguida, a equipe analisou os padrões de sono de seis famílias turcas. 39 dos participantes tinham SAFS e portavam a mutação no CRY1, e 31 não tinham nem a condição, nem a mutação.

Todos os portadores tiveram atrasos no início do sono e alguns apresentaram padrões de sono irregulares e fragmentados.

Para as 31 pessoas sem a mutação genética, o ponto médio do sono foi às 4 da manhã, mas para as pessoas com o gene, foi entre 6 e 8 da manhã – o que sugere que a mutação empurrou o relógio biológico pelo menos 2 horas.

E agora, José?

A boa notícia é que o nosso relógio biológico, incluindo o CRY1, é controlado por sinais externos, como a exposição à luz. Assim, as pessoas podem gerenciar efetivamente sua SAFS se seguirem uma rotina controlada.

“Um ciclo externo e uma boa rotina de sono podem ajudar a forçar um relógio lento a acomodar um dia de 24 horas”, disse a principal pesquisadora do estudo, Alina Patke, da Universidade Rockefeller em Nova York (EUA). “Nós apenas temos que trabalhar mais duro nisso”.

Patke acrescentou que drogas podem ser desenvolvidas no futuro com base nesse mecanismo, para ajudar essas pessoas.

Os pesquisadores enfatizaram que nem todos os casos de SAFS são causados por essa mutação genética. Apesar disso, eles descobriram que 1 a cada 75 indivíduos de ascendência europeia não-finlandesa possui a variante, de forma que ela tem um efeito em uma grande fração da população.

Mais pesquisas precisam ser feitas para entendermos melhor como a mutação afeta outras funções corporais além do sono.

Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na revista científica Cell. [ScienceAlert]


Fonte: Hypescience

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