Mais de 80% das mulheres diagnosticadas com câncer, em idade reprodutiva, se preocupam e buscam informações de como preservar sua fertilidade. Mas segundo estudos 30% não são informadas apropriadamente de como proceder.

Atualmente, para essas pacientes o sonho da maternidade pode ser alcançado por meio da criopreservação de óvulos, que é a técnica mais estudada ou através da criopreservação de tecido do córtex ovariano, ainda considerada experimental, mas com bons resultados reportados.

O aconselhamento deve ser individualizado e de acordo com múltiplas variáveis como o risco de falência ovariana, a reserva ovariana, idade, prognóstico da paciente, tipo de medicamento ou tratamento a ser prescrito (tipo de quimioterápico) e tempo disponível sem prejudicar o tratamento proposto. A criopreservação deve ser realizada antes dos tratamentos de quimioterapia e radioterapia.

Uma vez calculado o risco da infertilidade temporária ou permanente, o procedimento deve ser indicado e acompanhado em conjunto pelo médico oncologista e o especialista em medicina reprodutiva. A ginecologista Dra Carla Iaconelli, referência em reprodução humana no Brasil, nos explica melhor sobre essa técnica e como funciona em cada pessoa:

“Existem dois métodos de congelamento de óvulos que são mais utilizados, o congelamento lento ou a vitrificação. O primeiro processo diminui aos poucos a temperatura do óvulo depois de incluir uma substância que impede o surgimento de cristais de gelo, esse procedimento é importante, pois os cristais podem romper os óvulos. O congelamento lento é ineficaz e foi abandonado da prática pela imensa perda de óvulos após o descongelamento. Na vitrificação o congelamento acontece de forma rápida, o óvulo é congelado de forma abrupta, indo a -196°C em alguns segundos evitando que sejam formados cristais, desta forma temos aproximadamente 90% de recuperação dos óvulos descongelados”.

O procedimento é realizado após estímulo ovariano por 11 ou 12 dias com hormônios iguais aos utilizados para fertilização in vitro (FIV), mas com protocolos específicos para essas pacientes; seguido de punção dos ovários sob anestesia. Os óvulos maduros são congelados e guardados até que a paciente encerre o tratamento contra o câncer.
“Pode ser realizada a criopreservação de tecido ovariano, que também tem que ser feito antes da quimioterapia. Consiste em coletar fragmentos desse órgão por cirurgia, para um transplante futuro. Essa técnica é ofertada quando a paciente é pré-pubere ou não há tempo suficiente para o estímulo ovariano. Atualmente, há relatados 75 casos de nascimentos por meio dessa técnica. Uma vantagem é que não é necessário fazer FIV para tentar engravidar, e se precisar realizar Fertilização in Vitro poderá fazer sem prejuízo dos transplantes”.

Um estudo recém-publicado pela revista Fertility and Sterility reportou taxa de sobrevida dos óvulos descongelados de 77,3%, com 32,6% de taxa de nascidos vivos após uso dos óvulos descongelados, que, segundo os autores foi menor que taxa de nascidos vivos usando o mesmo método para mulheres sem câncer que pretendiam apenas preservar a fertilidade, que foi de 50% (todas com menos de 36 anos na época do congelamento), sugerindo que apenas o fato de ter o diagnóstico de câncer já afetaria a qualidade dos óvulos antes mesmo da quimioterapia. Neste mesmo estudo, verificaram que a taxa de nascidos vivos após transplante de córtex de ovário foi de 18,2%, e metade destas conceberam de forma natural, sem precisar de FIV.

“Há também a possibilidade de cirurgia para elevação dos ovários, no caso de pacientes que serão submetidas à radioterapia, com a meta de desviar os ovários dos raios quando o tratamento estiver previsto para a pelve da paciente. É importante que nós médicos informemos adequadamente sobre as possibilidades de preservação de fertilidade, mesmo em pré-púberes e mulheres com mais de 35 anos, mostrando os dados disponíveis até o momento e as técnicas para que elas possam decidir em curto espaço de tempo entre o diagnóstico do câncer e o início do tratamento qual seria a melhor opção para elas. Esse é mais um dos desafios que enfrentamos ao nos depararmos com esta doença”.


Dra. Carla Iaconelli é ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana.

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